Entende, por favor. Eu tenho que ir porque preciso estar
longe da tua voz, olhar, carícias e beijos. Se não existe mais o “nós”, é hora
de um dos dois partir. Não aguento mais ter que controlar meus sentimentos cada
vez que penso em te ligar ou quando te abraço. Sinto que cada vez que nos
falamos, uma chama em mim queima com mais fulgor, minhas entranhas se remexem e
meu estômago se torna um viveiro de borboletas. É como se tua voz fosse o
fósforo que acendesse dentro de mim o tonel de pólvora que existe. E ele
explode. E sinto a chama tomar conta de tudo. Mas quando você vai, só sinto as
cinzas que sobraram.
Setas perigosas esses teus olhos negros. Eles me perfuram,
sinto a dor. A luz que vem deles é capaz de clarear até a alma mais escura. A
mim, ilumina. Meia-noite vira meio-dia e nem dos óculos preciso mais. Você vai;
tudo fica escuro como antes da criação.
Não quero lembrar tuas mãos e boca pelo meu corpo. Máquina
de tortura. Ao mesmo tempo, pluma leve que acalmava. Doía, mas eu relaxava. Era
do que eu precisava pra sentir os meus músculos, pra saber que eu não tinha só
o meu coração que, naquele tempo, já era teu, mas que existia em mim outro
corpo que tremia por você. Sem você, vivo na inércia.
Entendeu por que devo ir? O pouco de vida que sobrou em mim
precisa ser preservado. Vou deixar o tempo apagar meu amor por você e, caso não
dê certo, vou contar a todos que já existiu na terra, um homem capaz de matar
alguém dando um sopro de vida.
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